segunda-feira, 16 de março de 2015

A DURA VIDA DA CRIANÇA DE HOJE

FERNANDO AZEVEDO

Tenho plena consciência que o problema não tem retorno, mas tento dentro do possível minimiza-lo, discuti-lo, porque não existe mais criança e eu que estou velho por fora não estou velho por dentro, pois o menino que mora dentro de mim não envelhece e convivendo com outras no meu trabalho me sinto um deles. Não vou querer imbecilmente que nos dias de hoje haja festa de debutantes, quando todas as meninas jovens de 15 anos num ato simbólico, despediam-se de seus sapatinhos baixos e usavam pela primeira vez o salto alto. Também não vou querer que os meninos usem calças curtas até entrarem na adolescência quando passavam a usar calças compridas. Isso eram atos sociais simbólicos e ultrapassados, mas não posso entender como se adultiza uma criança pequena, ato que julgo irresponsável e danoso. Uma menina não tem que usar batom, blush e outras maquiagens. Tem que ter boneca e não computador ou i-phone. Tem a obrigação de brincar o dia todo e não ter dois expedientes de atividades que as levam à exaustão e mau humor e sono conturbado. Aulas e aulas o dia inteiro e não brincadeiras. Quem conhece meu consultório sabe que lá está instalado o Partido Anárquico Libertador. Lá podem mexer em tudo, brincar com tudo menos com o meu material de medicina como estetoscópio, termômetro etc. Muitas mães me dizem “saiu de casa arriadinho, mas quando chegou aqui ta do jeito que você está vendo. Parece mentira quando lhe falei no telefone”. Ali tenho a primeira impressão que a doença não é grave e a segunda que está sendo proibido de brincar. Hoje chegou um fardado pronto para ir para a escola e levou até uma cobra maior do que uma que tenho na minha sala, feita de tampinhas de garrafa. Uma cascavel. Depois de muito brincar disse que não queria ir para as aulas e recebeu meu total apoio. Gazeta. Brincar. Esse é o melhor investimento para o futuro. Entre os dois e quatro anos a criança tem seu pensamento mágico que deve ser conservado e estimulado. Ela cria personagens, conversa com eles e se defendem das chateações que querem lhe impor. Não se deve destruir as fantasias e historias infantis. Era e sou louco por Papai Noel que me deu tantas alegrias ao despertar no Natal. Não fiquei idiota por ter sido seu amigo agradecido. Quando os mais velhos dizem que o bom velhinho é uma fantasia é comum à decepção, mas logicamente que isso é superado pelas alegrias e expectativas positivas que duraram alguns anos. Criança não gosta de tecnologia, ela usa, mas se for realmente uma criança não trocará um iPhone ou um tablet por uma bola ou boneca. Investindo na alegria da infância teremos uma sociedade de adultos fraternos. Se trocarem por competição em suas diversas formas os psiquiatras enchem seus consultórios.

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